terça-feira, 27 de abril de 2010

Me detenho

Será que eu faço o que é certo
Ou me detenho no incerto?
Das minhas escolhas tenho certeza
Ou me detenho na incerteza?
Será que venço os obstáculos
Ou me detenho em meus medos?
Sigo a minha ideologia
Ou me detenho em vossas leis?
Será que amo quem me ama
Ou me detenho em gostar?
Conquisto por mim mesmo
Ou me detenho em ser orgânico?
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Me detenho em mim mesmo
Não me encaixo no contexto
Sigo apenas liberdade
Não cultivo a falsidade
Penso e sinto
Não consinto
Com o cinto
Que nos aprisiona
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MENDEL, G. M. Humano expresso. Erechim-RS: EdiFAPES, 2007.
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"Me detenho" é o primeiro poema que criei baseado em questionamentos. Ficou uma construção muito boa, acredito. Tem um ritmo envolvente e diz tudo sobre o que eu era na época.
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Mas o melhor de tudo é que não é um texto só para mim. Todos que o lerem poderão se identificar com o que está exposto, imposto, pressuposto e implícito ali.
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Posteriormente (bem posteriormente), fui apresentado à obra "Livro das perguntas", de Pablo Neruda, uma obra fantástica, extremamente recomendável, com indagações de cunho muito mais poético do que as minhas. Realmente tenho grande admiração pela poesia que pergunta (literalmente), pois é muito mais do que uma questão de pontuação no final da frase. É uma forma de dizer aos leitores: "Eu não me atrevo a afirmar nada, porque toda a afirmação é uma atitude orgulhosa. O importante é que vocês questionem, porque é através das perguntas que se chega às respostas."
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É mais ou menos isso, pessoal!
Espero que estejam gostando das postagens.
Abraço e tudo de bom a todos!
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P.S.: Uma atenção especial ao trecho "Penso e sinto / Não consinto / Com o cinto / Que nos aprisiona". Acho que as pessoas gostaram disso tanto quanto eu. Pelo menos é o que geralmente falam. Quando terminei esse poema, li novamente o final e percebi que poderia ter futuro. E é esse tipo de sensação, de empolgação, que me faz continuar - apesar de tudo...

quarta-feira, 21 de abril de 2010

A parte de um todo

Cada parte de um todo
Cada parte é o todo
O todo não faz parte
Da parte que me toca
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A parte do todo parte
Com todos que não faz parte
Da parte que compõe o todo
O todo está em toda parte
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Tudo briga com todo
A parte, parte com eles
Tudo e todos são parte
De tudo que talvez gostamos
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A união de tudo com todo
A guerra entre a parte e o todo
O todo que talvez parta
Parta com o coração de todos
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MENDEL, G. M. Humano expresso. Erechim-RS: EdiFAPES, 2007.
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Nossa, que alegria que senti após a criação desse poema! Parecia o próprio Camões!
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Durante anos disse aos outros e a mim mesmo que esse era o melhor produto da minha escrita; isso até eu começar a achar o "Humano expresso" ridículo, patético, vergonhoso, tendo em vista o seu conteúdo claramente amador (do ponto de vista da minha massacrante autocrítica).
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Além disso, deixando bem explícito que esse texto foi criado em 2004, descobri em 2006 (ou 2007) que existe o seguinte poema de autoria do grandíssimo escritor Gregório de Matos, ou "Boca do Inferno":
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O todo sem parte não é todo,
A parte sem o todo não é parte,
Mas se a parte o faz todo, sendo parte,
Não se diga que é parte, sendo todo
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Em todo sacramento está Deus todo,
E todo assiste inteiro em qualquer parte,
E feito em partes todo em toda parte,
Em qualquer parte sempre fica todo.
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O braço de Jesus não seja parte,
Pois que feito Jesus em partes todo,
Assiste cada parte em sua parte.
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Não se sabendo parte deste todo,
Um braço que lhe acharam, sendo parte,
Nos disse as partes todas deste todo
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Assim, depois de saber que o meu até então inédito jogo de palavras e sentidos já havia sido feito lá no Barroco, "A parte de um todo" quase perdeu a graça para mim. Digo quase porque, no segundo livro, publiquei "A parte de um todo 2".
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É isso, pessoal!
Até mais...

sábado, 17 de abril de 2010

A doença

A doença do homem
A doença do mundo
É o próprio homem
O mundo é o defunto
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A morte do homem
A morte do mundo
O homem provoca
Destrói o futuro
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O fim do ser humano
O fim de um ser profano
É culpa do homem
Do homem urbano
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O mundo é o defunto
Destrói o futuro
Do homem urbano
Chamado doença
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Ganância é o sintoma
Dinheiro transmite
Não existe cura
Apenas a morte
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MENDEL, G. M. Humano expresso. Erechim-RS: EdiFAPES, 2007.
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Eu acho esse poema bem bom! Gosto bastante dele, pois, mesmo sem ter domínio de técnicas de escrita poética apuradas, consegui construir um jogo de versos interessante para os 17 anos que eu tinha na época. Lembro que estava consideravelmente inspirado e motivado quando o criei; e é nessas condições que escrevo os meus melhores textos. Aliás, não sou muito de lapidar poesia. Lido bastante em cima dos meus escritos em prosa e pouco em cima dos versos. Acho que é porque estes saem com maior naturalidade.
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Quanto ao assunto do poema, acredito que não é preciso explicitar algo além do que já está exposto, não é?
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É...
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Até mais!

terça-feira, 13 de abril de 2010

O mal do tempo

Tenho nojo do tempo
Do mal que nos faz
O novo inventa
O antigo agüenta

Triste sabedoria
Almejando a ingenuidade
Agora descansa
Tem saudades do cansaço

Agora vives cansado
Não sonhas com nada
Esqueces de tudo
Repete as palavras

Beirando a morte
Triste e enfermo
Frágil e amante
De lembranças queridas


MENDEL, G. M. Humano Expresso. Erechim-RS: EdiFAPES, 2007.


Criei esse poema após a morte do meu avô paterno. Apesar das variações dos pronomes pessoais e das repetições, características recorrentes nos meus textos daquela época, "O mal do tempo" sempre me pareceu um assunto pertinente.

Na primeira estrofe, procurei tratar do caráter refutável que o velho tem em nossa sociedade. Os idosos são tratados como aparelhos eletrônicos fora de linha, sendo jogados em qualquer canto para que esperem o tempo lhes consumir.

Continuo nessa linha de pensamento na estrofe seguinte: os aposentados são ultrapassados e, por isso, devem apenas descansar depois de uma vida inteira de trabalho - um dos eufemismos mais claros que se tem notícia.

Após, refiro-me especificamente ao meu vô, que, nos seus últimos anos, tinha sua saúde e seu ânimo abalados pelo Mal de Alzheimer e pela quase cegueira.

Por fim, ressalto o caráter romântico do estado deprimente em que estava o meu muito querido familiar: inseria-se cada vez mais no mundo de sua infância, não mais como nostalgia, mas como realidade. Ou seja, procurava constantemente pela casa onde morava quando era criança, confundia filhos e netos com seus irmãos, perguntava para o meu pai em que lugar havia amarrado o cavalo; só não esquecia da minha avó, embora raras vezes a tratasse por "mãe", o que não seria de forma alguma uma mentira.

É mais ou menos isso...

Até breve, caros leitores.

quarta-feira, 7 de abril de 2010

Caminho incerto

Um único caminho
Caminho odioso
Caminho de lembranças
De separação

Não temos escolhas
Mas somos obrigados a escolher
Nada conhecemos
Tudo repudiamos

O fim do caminho
De um novo caminho
Caminho da vida
Da vida desiludida

Nos mobilizamos
Estamos otimistas
Então superamos
Ou recomeçamos

O mundo dá chances
Chances de escolha
Da vida suicida
Ou do clímax vital

Uma certa idade
Com certas escolhas
Por novas fronteiras
E incertos caminhos


MENDEL, G. M. Humano expresso. Erechim-RS: EdiFAPES, 2007.


Esse é um poema bastante rico, que proporciona inúmeras leituras. No entanto, quando o escrevi, eu tinha em mente a condição em que me encontrava naquele momento: meus colegas de terceiro ano do Ensino Médio e eu, gente de classe média, pensávamos no que deveras iríamos ser quando crescêssemos. Ou seja, estávamos prestes a escolher que curso superior iríamos frequentar e onde isso iria acontecer.

Aquela realidade não me agradava nem um pouco. Não queria me separar dos meus amigos, muito menos pensar em ser alguma coisa. Estava ótimo não ser nada nem ninguém!

Por outro lado, via vários amigos animadíssimos com as possibilidades e, de certa forma, desejava estar como eles. Olhando o futuro sob aquele prisma parecia ser muito mais fácil. Só que eu sempre fui bastante fatalista, o que complica um pouco as coisas.

Bem, talvez eu só estivesse prevendo o que iria acontecer: virei escritor do gênero mais desinteressante da literatura atual (e o único que consigo produzir com certa habilidade, quase como uma condenação - me sinto como um cara que enxerga num mundo onde só a cegueira tem valor) e me formei em uma licenciatura, o que nos dias de hoje pode ser comparável a ir para o exército e descobrir que uma guerra se aproxima. Mas tudo bem... Eu não preciso enfrentar guerra alguma, tendo em vista que ninguém quis me contratar. (Contudo, caso resolverem mudar de ideia eu sou um excelente soldado, ouviram?)

Obs.: Perdão pelo tom melancólico da postagem. É que todas essas lembranças me causaram um certo desconforto e/ou saudosismo - coisas típicas de alguém regido por Câncer, não é mesmo?

P.S.: Novamente esse poema é repleto de versos desconexos e divagantes. No entanto, se em toda vez que eu publicar um poema no blog ficar chamando atenção para os defeitos de construção do texto, todos acabarão se cansando de visitá-lo. (É que isso é algo típico de professor de Português: ficar se preocupando com erros linguísticos - coisa que ninguém se importa muito - como um proprietário de imóvel que aluga sua sala para um bloco de carnaval. É óbvio que os foliões irão quebrar tudo, então "relaxa e goza".)