segunda-feira, 28 de junho de 2010

Suicídio adolescente

Eu sou bem mais fraco
Eu sou o bem mais fraco
Vivo entre suas entranhas
Procurando a proteção ilusória

Quem irá me proteger do mal?
Quem irá me afastar do casual?
Quem irá descobrir quais são...
As agressões internas e externas?

No fundo do poço
É bem mais seguro
Na entrada do poço
Eu posso tombar

Feliz ou triste...
Alguém desiste?
A queda assusta mais
Do que a situação imóvel



MENDEL, G. M. Humano expresso. Erechim-RS: EdiFAPES, 2007.


Esse poema fala sobre desilusão. Aquela desilusão que pode levar sua vítima ao ponto de cometer suicídio – por não acreditar mais no mundo, nas pessoas, no futuro. “Suicídio adolescente”, pois muitas vezes acontece precocemente (até antes da adolescência, durante a infância, quando a criança é perversamente oprimida pelo bullying).

A primeira estrofe denuncia a fraqueza, cuja influência amaldiçoa qualquer um, tendo em vista que todos têm um limite, uma hora que pensa em desistir, em parar de lutar.

A segunda trata a respeito do medo do porvir, dos acidentes de percurso. Ela retoma indiretamente o termo adolescente, já que na referida fase da vida os seres humanos têm mais medos e angústias do que em outros momentos da sua existência.

Em seguida há umas sacadinhas das quais gosto bastante: “No fundo do poço é bem mais seguro.” / “Na entrada do poço eu posso tombar.” Ou seja, quem está no fundo do poço sabe que não tem nada a perder, que não pode ficar pior – o que de qualquer forma é uma posição segura. E quem está rondando o poço pode cair a qualquer hora – o que traz a insegurança.

Para finalizar, pus de uma maneira diferente aquilo que foi exposto acima: “A queda assusta mais do que a situação imóvel.” Isso, após um convite a desistir... Desistir do quê? De viver? De morrer? Pois a desistência também pode ser boa. Você pode desistir de tirar a própria vida, de parar um curso que está fazendo, etc.

É isso. Mas para terminar adicionarei duas admiráveis músicas compostas pela banda Inocentes:

Nada pode nos deter: Quando eu nasci... / Me disseram que era pra esperar, porque / O futuro seria todo pra mim / Agora eu cresci... / E cansei de esperar e descobri / Que o futuro não é aqui / Hoje eu estou / Sobre os restos e os escombros do que sobrou / Das mentiras que tive que engolir / Nada mudou... / As mentiras são as mesmas, só eu que não sou / Aquele cara que ficava sem reagir / Não sigo normas, não sigo leis / Que deixam tudo como está / Fazem da liberdade algo a se procurar / Não tenha medo, me dê sua mão / Ninguém mais vai nos enganar / Vamos pra qualquer lugar / Ninguém vai nos parar! / Ninguém vai nos deter! / Ninguém vai nos parar! / Nada pode nos deter! / Nada pode nos parar!

Um cara qualquer: Eu só queria ser / Um cara comum, / Um cara qualquer / Sem ambições, / Que aceitasse a vida como ela é / Eu só queria não acreditar / Em nada, em nada... / Eu seria tão feliz / Mas eu não sou assim / Infelizmente a sorte não sorriu pra mim / Eu vivo a brigar / É difícil eu aceitar / As coisas como elas estão / As coisas como elas são / Mas eu não sou assim / Eu só queria ser / Mais um cara perdido na multidão / Sem nenhuma angústia, nenhum medo ou frustração / Eu só queria não me incomodar / Com nada, com nada... / Eu seria tão feliz / Mas eu não sou assim / Infelizmente a sorte não sorriu pra mim / Eu vivo a brigar / É difícil eu aceitar / As coisas como elas estão / As coisas como elas são / Mas eu não sou assim

terça-feira, 22 de junho de 2010

Bicho chorando

Bicho sensível
De força maligna
Repele o mal
Que me ensina
Que azul é o céu
Verde é a flora
Que fino é o véu
Que apaga a memória

Bicho insensível
De força maligna
Deserta é a fauna
E cinza é o céu

Não há mais fauna
Não há mais flora
Não há mais calma
Não há mais agora

Não há mais demora
Não há mais alerta
E o podre desperta
A alma que implora



MENDEL, G. M. Humano expresso. Erechim-RS: EdiFAPES, 2007.


O poema “Bicho chorando” é um dos que eu mais gosto do primeiro livro. Ele tem um certo valor, tanto que foi escolhido para ser declamado em um grande e belo evento de poesia realizado na Escola Estadual Haidée Tedesco Reali.

Desta vez, ao invés de comentar a respeito do conteúdo do texto, postarei algumas letras de músicas da banda Cólera (São Paulo-SP), presentes no álbum “Verde, não devaste!”, de 1989.

Considero importante colocar essas letras, tendo em vista que, durante o processo de produção do “Humano expresso”, as músicas que eu ouvia me influenciaram muito mais do que os textos que lia. (Na realidade, grande parte das canções são textos extremamente ricos, onde letra e música colaboram uma com a outra para formarem obras de arte inacreditáveis.) E a adoração pela banda Cólera teve uma grande contribuição nos poemas da minha primeira obra. Então, cabe aqui esta homenagem.

“Da última árvore para o último animal”: Nós estávamos aqui / Antes de você, antes deles, / Quando o mundo desconhecia a violência / Nós existimos há trilênios / Alimentando a todos. / Aos poucos você foi vendo / Eles chegando com uma invenção / Usavam aqui para nos cortar / E com nossos pedaços em brasa / Se aquecer. / Então eles fizeram armas e motores / Com armas te caçavam / Com motores nos cortavam. / Você viu sua espécie aniquilada, / Você viu nossas sombras sumirem, / Água e ar, vítimas de contaminação / Química. / Você viu armas feitas com / Pedaços de nossos corpos, / Você viu sua pele irmã / A preço promocional na vitrine. / Eles não viram nada além do lucro, / Eles usam sua pele / Sentados sobre nossos pedaços. / Eles têm projetos milionários para / Exterminar todos nós. / Observe agora, eles já estão cegos e / Suicidas. / Olhe ao redor, só eu e você, / Eles morrem aos poucos e / Nada mais, nada mais podemos fazer, / Nada mais...

Presídio Zoo: Bem-vindo ao Zoo, Presídio Zoo, a jaula foi feita pra você / Muitas crianças, vai divertir, porcarias elas vão te dar / Da sua espécie, nada sobrou, você é raridade e vale um milhão / Veja os papéis, você é meu! Veja os papéis, você é meu! / O erro do homem é gananciar, o que não se vende ele sempre quer comprar / É ilegal comprar, vender. / O animal não pertence a você! / É ilegal comprar, vender. / O animal não pertence a você! / ANIMAIS não fazem guerras! / ANIMAIS não pertencem a ninguém! / ANIMAIS não destroem selvas! / ANIMAIS não matam por prazer! / ANIMAIS não constroem bombas! / ANIMAIS pode ser você! / ANIMAIS não poluem o ar! / ANIMAIS, A, A! / Zooona! Presídio Zoo onde exponho você / Pra te amansar, te controlar / E por dez milhões te vender / Seria bom se os animais pudessem contar / Com todos vocês pra apoiar, pra defender / O seu direito de viver. Pra apoiar, / Pra defender a liberdade de ser / ANIMAIS não fazem guerras! ANIMAIS não destroem selvas! / ANIMAIS não constroem bombas! / ANIMAIS não poluem mares! / ANIMAIS não pertencem a ninguém! / ANIMAIS não matam por prazer! / ANIMAIS pode ser você! / Animais, A-NI-MAIS!

Don’t waste it: “Animais não são nossos para satisfazer nossos prazeres violentos!” / Destrua os caçadores!! No forest, no animals, no ocean, no air! / Who can live in this world??? / Veja quanto gás polui o ar e os vegetais, floras e faunas assassinas / Estupidamente pra que? / Esses canalhas que ferem o mundo deviam se suicidar, pois seus cérebros só destroem o céu, a terra e o ar! / PRECISAMOS RESPIRAR! PRECISAMOS RESPIRAR!

Verde: Onde haviam riachos limpos / Hoje só vemos estrume humano / O chão que era coberto por / Folhas secas está encoberto / Pelo concreto / Quem quer que mate a toa / Quem queima e corta / Florestas e reservas / Só pensa em lucrar / Mas isso é roubar! / MINHA VIDA, SUA VIDA, / NOSSAS VIDAS DEPENDEM DO VERDE / MINHA VIDA, SUA VIDA, / NOSSAS VIDAS DEPENDEM DO / VERDE, DEPENDEM DO VERDE / JÁ! / O homem já inventou / Máquinas que voam / Mas não inventou o verde / O homem já criou / Cérebros e bombas / E esqueceu do verde / O homem não pensa muito / Na hora de explorar / Por mais que destrua a vida / Só pensa em lucrar / Mas isso é roubar! / MINHA VIDA, SUA VIDA... / Ponha ele em pé com a serra elétrica, / Corte no início da perna, / Corte no início da perna. / Código de indústria pra fazer papel / Ou armarinho de luxo / Ou armarinho de luxo


Como vocês podem ver, as composições da Cólera são bastante parecidas com as minhas: há protesto, há vontade de fazer uma arte engajada e há erros de escrita, decorrentes da falta de conhecimento que eu também tinha quando escrevi a primeira obra poética.

Por fim, cabe observar que em 1989 os caras já chamavam a atenção para um problema bastante atual, sinal de que a questão ambiental é consideravelmente antiga. Desde sempre há gente tentando conscientizar a população, só que esses são os que têm menos voz dentro da sociedade.

É isso.

terça-feira, 15 de junho de 2010

Espelho meu! (Transição)

Estão cobrando de mim um personagem novo
Estão cobrando de mim a relação com o povo
Estão cobrando de mim uma atitude moderna
Estão cobrando de mim uma postura deserta

Estão sonhando por mim o que desejam por eles
Estão vivendo por mim o que viveram por eles
Estão fazendo por mim o que fizeram por eles
Estão mostrando p’ra mim um mundo feito p’ra eles

Eu não pedi p’ra nascer
Eu não nasci p’ra viver
Eu não vivi p’ra sofrer
Eu não sofri p’ra morrer!


MENDEL, G. M. Humano expresso. Erechim-RS: EdiFAPES, 2007.


Esse poema é um discurso gritante dentro da minha cabeça, porque fala de algo que sentirei na pele por toda a vida: pressão.

A primeira estrofe, clara como é, fala das constantes cobranças que o mundo e os outros fazem: criar personagens para saber como lidar com as diversas situações; construir amizades para não ter que sobreviver sozinho e, assim, se ferrar (já que o ser humano vive em sociedade); agir de acordo com os outros para não ser chato; e ser menos sério, ou mais malandro, pois, como aponta um dos ditados modernos mais recorrentes, “bonzinho só se fode!”.

A outra revela que neste mundo é impossível ficar em paz, tendo em vista que se vive com os outros e eles querem que você seja mais um – mais um dos inúmeros patéticos que se encontra por aí.

E a última, através de um jogo que considero bastante eficiente, mostra envolventemente a profundidade da agonia que apresenta alguém que não se sente confortável por aqui.

Mas...

Há também o sentido do segundo título do poema, “Transição”, diretamente relacionado ao que foi exposto acima, uma vez que ao se sair da adolescência tudo muda: a visão de mundo, as expectativas, as preocupações, a posição da pessoa no meio, etc.

FIM!
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TEXTOS COMPLEMENTARES:
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Pressão social (Banda: Plebe Rude) Há uma espada sobre a minha cabeça / É uma pressão social que não quer que eu me esqueça / Que tenho que estudar, que eu tenho que trabalhar / Que tenho que ser alguém, não posso ser ninguém / Há uma espada sobre a minha cabeça / É uma pressão social que não quer que eu me esqueça / Que a minha vitória é a derrota dele / E o meu lucro é a perda de dele / Que eu tenho que competir, que eu tenho que destruir / Há uma espada sobre a minha cabeça / É uma pressão social que não quer que eu me esqueça / Que eu tenho que conformar, conformar é rebelar / Que eu tenho que rebelar, rebelar é conformar / E quem conforma o sistema engole / E quem rebela o sistema come / E quem conforma

Alien (Banda: Devotos) Eu vim aqui mesmo sem planos / Estou aqui não sei porquê / Me ajude a ser humano / Não quero me perder / Não quero falar dos meus sonhos / Não quero pedir para viver / Me ajude a ser humano / Não quero me perder / Eu tenho o sono dos anjos / Eu tenho a fome de viver / Me ajude a ser humano / Não quero me perder / Não quero falar dos meus sonhos / Não quero pedir para viver / Me ajude a ser humano / Não quero me perder... / Não quero me perder!!!

sexta-feira, 4 de junho de 2010

De tudo

Hoje veja
Hoje seja
Seja um louco
Seja um pouco...
De tudo

Hoje corra
Hoje morra
Mas tente
Mas invente...
De tudo

Hoje chore
Hoje sorria
Hoje namore
Hoje desistia...
De tudo



MENDEL, G. M. Humano expresso. Erechim-RS: EdiFAPES, 2007.


"De tudo" é um poema simplíssimo, mas com pontos interessantes. No final das estrofes, por exemplo, a expressão “de tudo” marca um dos aspectos mais legais desse produto da ansiedade (na minha modesta opinião): ela vai do positivismo dos dois primeiros segmentos ao negativismo do último, quando a quebra do caráter animado do texto é feita por meio do verso “Hoje desistia...”. Pois anteriormente, independentemente de quais fossem as atitudes tomadas (tornar-se um louco desenfreado; correr, morrer, tentar, inventar; chorar, sorrir, etc.), o indivíduo estaria apenas vivendo intensamente, “curtindo a vida adoidado”. E em seguida há um rompimento do ritmo anterior, causado pelo sentido da expressão “desistir de tudo”, que indica um descontentamento com a própria vida, e pelo tempo verbal mal-empregado naquela construção, que chama a atenção por não se encaixar de forma perfeita linguisticamente, tanto no poema quanto na percepção dos leitores (acredito eu).

Enfim, bom ou ruim, é um texto que trata sobre a inconstância do espírito e a bipolaridade da existência, com seus altos e baixos...

Fui!