segunda-feira, 18 de fevereiro de 2013

Sobre a educação escolar

Eu sou um professor de Ensino Fundamental e sei muito bem de todas as questões que estão presentes na prática escolar. Sabe-se que as instituições escolares não estão alcançando os resultados esperados por parte dela e, em virtude disso, pessoas de todas as áreas estão apontando o dedo para muita gente, querendo colocar a culpa pelos maus resultados nos professores, nos pais, nos alunos, nos cúrrículos, no sistema. Na minha modesta opinião, a escola é o reflexo da sociedade e, se a sociedade está doente, a escola também estará. 
 
Atualmente, a sociedade confunde liberdade com libertinagem. As pessoas estão vivendo numa espécie de clima pré-apocalíptico, pois importam-se apenas consigo mesmas, sem respeitar aquilo e aqueles que as rodeiam. Parece que estão aproveitando o seu último dia de vida, no qual é preciso realizar tudo aquilo que se deseja, sem se preocupar com o dia seguinte.

Eis o panorama que vem à minha cabeça: Não importam os valores morais, o importante é aparecer. Não importa a bagagem cultural, o importante é a quantidade de pessoas que se conhece - seja pessoalmente ou não. Não importam as famílias, o importante é o que eu tenho para mostrar e, por conta disso, conquistar novas relações. O número de artistas em evidência é o maior da história, mas nunca houve tão pouca qualidade cultural. O número de filmes lançados por ano é o maior da história, mas são raros os realmente bons. O número de novidades tecnológicas é o maior da história, mas a sociedade não precisa de verdade de tablets, celulares 10 em 1, etc. É cada vez maior o número de redes sociais, mas é cada vez menor o número de amigos verdadeiros. Antigamente, era proibido beijar nos filmes; hoje, as cenas de sexo são indispensáveis. Antigamente, era preciso adicionar poesia nas composições musicais; hoje, é preciso falar em sexo, drogas e adicionar monossílabos tribais nas "músicas". Antigamente, era preciso ter cuidado com a única muda de roupa, com o único par de sapatos que se tinha; hoje, é preciso ter todos os tênis e as roupas da moda. Antigamente, era indispensável ter valores morais; hoje, é indispensável melhorar a imagem, a qualquer custo. Antigamente, os alunos precisavam batalhar muito para ganhar um doce dos pais; hoje, alunos repetentes têm os videogames mais caros para jogarem à vontade e os celulares mais completos de sua época. Antigamente, os pais acompanhavam o desempenho escolar dos filhos, inclusive auxiliando no dever de casa; hoje, os "pais" só têm filhos para verem com que cara saem e, em seguida, jogar para as babás, para as creches, para as escolas. Antigamente, os jovens escutavam Cazuza, Legião Urbana, Nirvana; hoje, escutam Michel Teló, Psy, Beyoncé.  Antigamente, os jovens assistiam a "À espera de um milagre"; hoje, assistem a "Velozes e Furiosos". Antigamente, cinema brasileiro era Mazzaropi, com sua crítica social e humor decente; hoje, cinema nacional é... eu não sei mais o que é o cinema nacional, só sei que tem palavrão e sexo. Antigamente, os estudantes saíam para as ruas, para lutar por justiça; hoje, os estudantes continuam saindo para as ruas, para matar aula. Antigamente, professor era uma autoridade; hoje, professor é um bandido opressor. Antigamente, sexo era "Cine Privé", um programa que era transmitido nas madrugadas da TV aberta; hoje, o sexo explícito, com todas as suas ramificações, está acessível a todos, a qualquer hora, bastando digitar algumas simples palavras no Google. Pessoas que estudam durante anos para conseguir uma boa colocação no mercado de trabalho têm de se contentar com um salário miserável e com condições precárias de trabalho, enquanto traficantes e políticos corruptos estão milionários.
 
Enfim, numa sociedade onde tudo o que é errado é bonito, o verdadeiro professor é apenas um grão de areia no meio do lixão.

Um comentário:

  1. Sugiro algumas leituras caso tenhas interesse em investigar mais profundamente o assunto: Sociedade do espetáculo (Guy Debord), Microfísica do poder (Michel Foucalt) e Genealogia da moral (Nietzsche). Trata-se de uma questão muito complexa, que não podemos analisar como construções sem contexto, como fruto de uma descontinuidade,do acaso, agregando juízos de valor sobre épocas que não vivemos. Não podemos achar que as pessoas antigamente eram mais morais, obedientes ou politizadas, pois com as possibilidades atuais agiriam exatamente como essa "geração". Concordo com todos esses problemas, mas temos que ter cuidado ao analisar suas origens. Abraço.

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