O tempo nos passa.
Às vezes, até nos queima.
Às vezes, até nos estraga.
Quase sempre, nos endurece.
Recheamos o tempo
e ele nos enche.
Dominamos o tempo
e ele nos foge.
Observamos
a sua passagem
e, com ele,
vamos embora.
Neste blog publico poemas já lançados em livros e alguns outros textos que ocasionalmente me surgem.
O tempo nos passa.
Às vezes, até nos queima.
Às vezes, até nos estraga.
Quase sempre, nos endurece.
Recheamos o tempo
e ele nos enche.
Dominamos o tempo
e ele nos foge.
Observamos
a sua passagem
e, com ele,
vamos embora.
A comida estragada
já não presta.
Não mais apetece,
apenas enoja.
A quem tu alimentas,
putrefato pão?
Tu não mais nutres
quem agora
só (mente)
te nutre desprezo.
Fruto do descaso,
descuido vegetativo;
desperdício de tempo,
sentimento de desolação.
(MENDEL, G. M. Doravante. Erechim-RS: AllPrint Varella, 2019.)
Javenci era porteiro do glorioso asilo "Esqueceram de Mim". Mal sabia escrever o nome e não lia nem placas de "PARE". Mas era ambicioso. Muito ambicioso. Queria subir na vida. Nem que fosse para se jogar. "Deixa a vida me levar".
Então, com essa ideia fixa, batalhou, suou e subiu, por meios bem brasileiros. Depois de alguns anos e de algumas escalas, chegou a diretor da instituição. Ainda falava "nóis fiquemo", usando, por outro lado, terno e gravata e perfume importado.
Com o passar do tempo, Javenci engordou corpo e patrimônio. Quilo por quilo, tijolinho por tijolinho. Trocou uma pequena casa de madeira no meio do lixo por um apartamento extravagante em bairro de luxo, e uma bicicleta velha de 18 marchas por um carro estrangeiro de R$ 180.000,00. "Deiz pra mim, dois pros véio", ao longo de sua afamada gestão. E o povo, se achando esperto e humano: "Olha só como ele ajuda os necessitados!..."
Ganhando confiança, sociável que era, foi escolhido o síndico do condomínio "Winners' Paradise", onde morava, flanava e flutuava. Deu-se de um jeito satisfatório com a gente da alta. De maneiras surpreendentes, eles eram similares ao nosso herói! Como sempre, Javenci não hesitou, portanto exitou. Podem acusá-lo de várias coisas, menos de covardia.
Até que lhe bateu uma inquietação: "Diretô de casa de cardade e síndo do difício tá bão, mah não me dá nome. Eu quer que meus pai sinta orgulo de mi; pro meu pai vê que não sô o fracassado imprestávio quele sempre diss."
Porém, e são inúmeros poréns, para qualquer cargo melhor, mais vistoso, era preciso, no mínimo, estudo demais e qualificação de dar medo. E ele não tinha tempo para estudar! Estudar leva tempo e dinheiro. Além disso, no nosso país, é de conhecimento geral que, enquanto uns estudam, outros recebem oportunidades.
Sendo assim, vieram as salvadoras eleições municipais. E Javenci conquistou a inestimável honra de ser candidato a vice-prefeito, por um partido honesto como qualquer outro. O nosso agraciado faria dupla com um experiente grã-fino, companheiro seu lá do prédio.
Durante a campanha, transformou-se na figura mais simpática e prestativa que já pisou neste planeta. Encheu muita barriga, pintou muita casa, preencheu muita vaga (de creche, de subemprego), beijou muito bebê (e mãe de bebê); ajudou muito cego a andar (de carro reformado) e muito surdo a cantar (de galo, para defendê-lo).
E venceu. Bem fácil até. Afinal, após tantas lutas e vitórias, ele já sabia o caminho. Bastava percorrê-lo.
O resto da história não é preciso contar. Vocês já estão fartos de escrevê-la.
Quando eu era pequeno,
assim que acordava,
permanecia de olhos fechados,
vislumbrando estradas
que se (me) confundiam.
Naquele tempo, não sabia
qual caminho escolheria.
Tudo me parecia
confuso e distante...
(E ainda me parece!)
Nesta tortuosa travessia
denominada vida.
(MENDEL, G. M. Doravante. Erechim-RS: AllPrint Varella, 2019.)
A festa do vizinho
É a festa do vizinho –
E não a minha!
A raiva pela festa do vizinho
Não é pela festa do vizinho,
Mas sim pelo meu sono.
O sono do trabalho,
O sono da rotina,
Da responsabilidade –
Coisas que o mundo exige
E o meu vizinho desconhece.
***
A festa do vizinho
Atravessa o meu muro,
Mas não derruba barreiras.